Atualização Científica Mundo Animal Volume III - Dermatopatias em Pequenos Animais

Empresa

Mundo Animal

Data de Publicação

16/06/2016

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Autoras

M.V. Amanda Cologneze Brito - Responsável Técnica

M.V. Simone Amitay - Coordenadora de Marketing

Design

Guilherme Rafael Brugni

Introdução

A pele é o maior órgão do corpo e funciona como uma barreira anatomofisiológica entre o animal e o meio ambiente. Fornece proteção contra lesão física, química e microbioçógica, formando uma barreira protetora, sem a qual a vida seria impossível. Além disso, é sinérgica com os sistemas orgânicos internos, refletindo, portanto, processos patológicos diversos 15,18

A função mais importante da pele é tornar possível um ambiente interno para todos os outros órgãos, mantendo uma barreira eficiente contra a perda de água, eletrólitos e macromoléculas, impedindo que agentes lesivos internos adentrem o ambiente interno.18

A pele é vista como um órgão imune que desempenha um papel ativo na indução e manutenção de respostas imunes, que podem ser benéficas ou nocivas. A microflora cutânea normal também contribui para a imunidade da pele. Bactérias e, ocasionalmente leveduras e fungos filamentosos, estão localizados na epiderme superficial e no infundívulo dos folículos pilosos. A microflora cutânea normal é um misto de bactérias que vivem em simbiose.18 Porém, uma colonização excessiva somada a uma série de alterações na superfície da pele pode dar início a uma infecção bacteriana.19

As afecções dermatológicas apresentam uma maior expressão no cão em comparação ao gato. Em cães, são mais frequentemente diagnosticadas a dermatite alérgica por picada de ectoparasitas (DAPE), neoplasias cutâneas, piodermite bacteriana, seborréia, atopia, dematose imunomediada, dermatose de origem endócrina e dermatose parasitária. Já os gatos apresentam com mias frequência as dermatoses de origem parasitária, complexo granuloma eosinofílico felino, doenças micóticas, reações de hipersensibilidade, doenças bacterianas, quadros seborréicos, neoplasias e dematoses autoimunes.15

A maioria dos fatores envolvidos no aumento da suscetibilidade à piodermite nos cães está relacionada às diferenças anatômicas quando comparadas com outras espécies. O delgado e compacto extrato córneo canino, com seu material intercelular esparso e rico em lipídeos, representa uma barreira epidérmica pouco eficiente contra o potencial invasor de bactérias entre os folículos pilosos, acarretando uma frequência aumentada da área de infecção bacteriana superficial. Essas infecções superficiais do folículo piloso representam o grupo mais comum de doenças bacterianas da pele nos cães.14

As infecções de pele são classificadas como primárias ou secundárias, para refletir a ausência ou a presença de uma causa básica. As infecções secundárias são as mais comuns e resultam de alguma anormalidade cutânea, imunológica ou metabólica.18

Alguns fatores podem predispor a pele a infecções, tais como: fricção mecânica, trauma, umidade excessiva, sujeira, pelos aglutinados, irritantes químicos, congelamentos, queimaduras, irradiação, dieta inadequada e infestação parasitária, além da presença de fungos presentes na pele e uma colonização excessiva de bactérias.3

Cães alérgicos são especialmente propensos a infecções por causa da lesão que inflige a própria pele enquanto coçam, devido corticosteróides que frequentemente recebem e possivelmente por algumas anormalidades imunológicas associadas à sua predisposição alérgica.18

Áreas quentes e úmidas na pele, tais como dobras, pregas faciais de lábios, dobras do pescoço entre outras, muitas vezes apresentam altas contagens de bactérias quando comparadas a outras, e estão em constante risco de infecção. As regiões que recebem muita pressão, como os cotovelos, também são propensas a infecções, possivelmente devido à irritação e ruptura folicular devido à pressão crônica repetida.19

Gênero staphylococcus

Os microorganismos estafilocócicos, os isolados primários de infecções de pele em cães e gatos, não são particulamente virulentos e, portanto, toda infecção cutânea deve ser considerada como um sinal de alguma anormalidade cutânea, metabólica ou imunológica.18

Os estafilococos são cocos Gram-positivos, com aproximadamente 1 µm de diâmetro e que tendem a formar agrupamentos em arranjos semelhantes a cachos de uva.16

No mínimo 30 espécies de Staphylococcus spp ocorrem como comensais de pele e membranas mucosas; algumas podem atuar como patógenos oportunistas, causando infecções piogênicas.16

Os estafilococos coagulase-positivos S. aureus aureus e S. intermedius e o coagulase-variável S. hyicus são importantes patógenos de animais domésticos e responsáveis pela maioria das infecções cutâneas. A produção de coagulase está correlacionada à patogenicidade. Embora os estafilococos coagulase-negativos sejam pouco virulentos, alguns ocasionalmente causam doenças nos animais e no homem.16

Como os estafilococos são bactérias piogênicas, frequentemente causam lesões supurativas. Muitas infecções são oportunistas e associadas a trauma, imunossupressão, infecções parasitárias ou fúngicas recorrentes, condições alérgicas ou distúrbios endócrinos e metabólicos, que podem predispor ao desenvolvimento de infecções.16

Piodermite superficial

A piodermite é um problema rotineiro na prática clínica. É definida como qualquer condição que resulte em acúmulo de exsudato neutrofílico na pele. A infecção cutânea bacteriana pode ser primária, caso em que um tratamento apropriado frequentemente resolve o problema. No entanto, muito mais comumente, a piodermite é secundária a outro problema subjacente, como alergias ou doenças endócrinas, que altera a resistência da pele predispondo a uma reinfecção. Até que se identifique o problema subjacente, a infecção geralmente responde somente temporariamente à terapia e pode haver recidiva subsequente.2,14,15

A piodermite é causada por colonização bacteriana ou invasão da pele por estafilococos coagulase-positivos, sendo estes, os microorganismos iniciadores da infecção. Nas piodermites crônicas, recorrentes ou profundas, podem se encontrar presentes invasores bacterianos secundários, especialmente Pseudomonas spp, Proteus spp e Escherichia coli.2,14,21

Considerada a doença de pele mais comum em cães, porém rara em gatos, a piodermite superficial ocorre por invasão bacteriana da epiderme e folículos pilosos.11,18,21 Pode se manifestar de duas formas. Na primeira forma, as bactérias podem penetrar no estrato córneo com a subsequente formação de pústulas subcorneanas, sendo chamada de impetigo. Na segunda forma, as bactérias podem invadir a abertura do folículo piloso, causando inflamação, sendo chamada foliculite, que é considerada a mais comum das dermatoses, além de ser a de maior incidência entre os cães.2,11,14

Impetigo

O impetigo é uma doença bacteriana geralmente causada por microorganismos estafilococos coagulase-positivos e é mais comumente observado em cães jovens antes da puberdade.2,14,15

Caracteriza-se por pústulas subcorneais que acometem de modo esparso áreas da pele com pelos. Não é uma doença contagiosa. O pruido é raro e, quando presente, geralmente indica envolvimento folicular e, portanto, não um impetigo verdadeiro.18

Os fatores predisponentes são a má nutrição, ambiente sem higiene, infecções virais, ectoparasitárias ou doença imunomediada.2,14 Em casos de impetigo bolhoso, pode estar associado a distúrbios endócrinos como diabetes melittus, hipotireoidismo, hiperadrenocorticismo, além de outras doenças debilitantes e outros microorganismos causadores podem estar presentes, como Pseudomonas sp e a E. coli.14

O impetigo pode regredir espontaneamente, mas o tratamento pode apressar o processo de cura. Quando as lesões são poucas e bem separadas, antibióticos tópicos ou cremes antibacterianos podem ser eficientes. Em casos de lesões numerosas, são indicados banhos com shampoos antibacterianos contendo, por exemplo, peróxido de benzoila,2,11,18 além do uso de antibióticos sistêmicos.18,19

Foliculite bacteriana superficial

A foliculite superficial é ocasionalmente um problema primário induzido por estafilococos coagulase-positivos. No entanto, é muito mais comum a foliculite secundária a outra doença.2

Os microorganismos podem ser introduzidos por trauma local, uma infecção por contaminação devido a pelagens sujas ou tosa deficiente, seborréia, infestação parasitária como demodicose, fatores hormonais, irritantes ou alergias.11,14,18

Os agentes etiológicos mais comuns nas foliculites caninas são os estafilococos, os dematófitos e os ácaros demodécicos, podendo as foliculites superficiais progredir para foliculites profundas furunculose e até celulite.14,18

A foliculite superficial é geralmente diagnosticada através da observação de pústulas ao redor dos foliculos pilosos. A base da pústula é eritematosa, e geralmente ocorre prurido.2

A localização da infecção depende da causa predisponente. No traumatismo externo, a infecção está inicialmente localizada na área do trauma. Nos distúrbios sistêmicos básicos, predominam as lesões no tronco. Em ambos os casos, a infecção pode disseminar-se para envolver áreas mais amplas, especialmente se as lesões forem pruriginosas. Em casos crônicos, grande parte da pele pode estar envolvida.18

Piodermite Mucocutânea

A piodermite mucocutânea ocorre em cães e acomete primariamente os lábios e a pele ao redor da boca.8 Pode ser visto, com menor frequência, ao redor dos olhos, vulva, prepúcio e ânus. Sua etiologia é desconhecida.11

Cães de qualquer idade, raça ou sexo podem ser acometidos. A primeira mudança notada é uma tumefação e uma eritema simétrico dos lábios, especialmente nas comissuras. Segue-se a formação de crostas, que pode levar à fissura e erosão. O exsudato pode estar presente debaixo das crostas, especialmente ventral aos lábios. A despigmentação dos lábios pode ser vista em casos crônicos.18

A piodermite mucocutânea responde ao tratamento antibacteriano tópico ou sistêmico. No tratamento tópico, peróxido de benzoila pode ser usado junto a uma pomada bactericida. Em casos mais graves, antibióticos sistêmicos podem ser necessários. Recidivas são comuns.11,18

Intertrigo (piodermite de dobras cutâneas)

O intertrigo, também conhecido por piodermite de dobras cutâneas, é uma infecção bacteriana comum da superfície cutânea que ocorre em cães com excessivas dobras de pele.2,11 Essas dobras cutâneas criam um ambiente úmido, escuro e aquecido, com má circulação de ar e crescimento bacteriano e inflamação subsequentes.2

A infecção envolve as dobras faciais de raças braquicefálicas, dobras labiais de cães com grandes orlas labiais, dobras na cauda das raças braquicefálicas com caudas em "saca-rolhas", dobras vulvares de cadelas obesas e com vulvas pequenas, e dobras corporais de cães com excesso de dobras no tronco ou nas pernas, como em cães da raça Shar-pei. A obesidade é um fator contribuinte comum.11,16

Caracteriza-se por uma inflamação exsudativa leve, onde a área acometida apresenta-se com odor fétido, podendo existir evidências de escoriações, alopecia e eritema ao redor da região da dobra cultânea.14

O objetivo do tratamento é limpar e desinfetar a região da dobra cutânea, impedindo a recidiva da piodermite. Um shampoo com peróxido de benzoila pode ser utilizado para tal fim. Para cães que envolvem resposta inflamatória mais severa, o uso de cremes antibióticos/esteróides também é indicado. Como prevenção, um shampoo contendo peróxido de benzoila pode ser utilizado para evitar recorrência.2

Piodermite profunda

Piodermite profunda é uma infecção bacteriana que envolve tecidos mais profundos que o foliculo piloso. Invade a derme e com frequência o tecido subcutâneo.2,18 Seu desenvolvimento é precedido muitas vezes, por uma história de doença de pele superficial crônica e quase sempre associada a algum fator predisponente.11,18,19

A piodermite profunda é comum em cães e rara em gatos. Manifesta-se como lesões cutâneas focais, multifocais ou generalizadas., caracterizadas por pápulas, pústulas, celulite, descoloração tecidual, alopecia, bolhas hemorrágicas, erosões, úlceras e crostas, assim como tratos fistulosos de drenagem serossanguineloentos e purulentos.11

Os fatores que predispoem a piodermite profunda incluem a imunoincompetência do hospedeiro, lesão dérmica ou f olicular grave causada por uma doença primária e o tratamento inadequado de uma infecção superficial com um antibiótico ineficiente, um corticosteróide, ou ambos.18

embora existam muitas formas de piodermite profunda, as formas mais comuns são a foliculite profunda e a furunculose.2

Foliculite profunda e furunculose

A foliculite profunda e a furunculose inicialmente começam como uma foliculite superficial ou folicular ou de causa bacteriana, fúngica ou parasitária. É definida como uma inflamação do folículo piloso que se quebra através da parede e se estende no interior da derme e ocasionalmente no interior do tecido subcutâneo.2,14,18

Os estafilococos coagulase-positivos são os patógenos mais comuns envolvidos no início de uma piodermite profunda, podendo ocorrer uma invasão secundária por outras bactérias, como Pseudomonas spp, Proteus spp ou E. coli.2,18,20 Considerando que é quase sempre um desenvolvimento secundário, uma pesquisa completa de uma causa básica é essencial.18

A natureza das lesões iniciais depende do número de folículos envolvidos, da profundidade e da gravidade do envolvimento folicular e dos vários fatores do hospedeiro, especialmente sua imunocompetência.18

A foliculite e a furunculose bacterianas são raras no gato. Quando aparecem, pápulas e pústulas foliculares estão geralmente localizadas na face e na cabeça. A foliculite e a furunculose do queixo felino podem ser vistas como infecção secundária, complicando casos de acne felina.18

Toda foliculite crônica, principalmente quando associada à furunculose, pode tornar-se granulomatosa ou piogranulomatosa. A furunculose, independente da causa, frequentemente está associada à eosinofilia tecidual, que se relaciona a presença de um corpo estranho (ceratina ou pelos). As lesões de foliculite e furunculose podem ocorrer onde houver folículos pilosos, porém tendem a ser mais comuns sobre os pontos de pressão ou no tronco.14

A terapia tópica envolve banhos diários utilizando uma preparação de iodopovidona, uso de um shampoo contendo peróxido de benzoíla, e antibiótico sistêmico, cuja escolha deve ser baseada nos resultados da cultura bacteriana.2

Pododermatite bacteriana

A pododermatite bacteriana é uma infecção bacteriana profunda das patas que quase sempre ocorre secundária a um fator subjacente. É comum em cães e rara em gatos.11

Algumas causas de pododermatite bacteriana secundária são: corpo estranho, sarna demodécica, carrapatos, fungo, trauma, doenças autoimunes, endocrinopatias como hipotireoidismo ou hiperadrenocoricismo, hipersensibilidade alimentar ou atopia.11

Uma ou mais patas podem ser afetadas por eritema interdigital, pústulas, pápulas, nódulos, bolhas hemorrágicas, fístulas, úlceras, alopecia ou edema.

O prurido (lambedura, mastigação), dor ou claudicação podem estar presentes. Ocasionalmente, o edema depressível do metatarso ou metacarpo associado é observado.11

Para que o tratamento das pododermatites bacterianas seja satisfatório, é necessário que a causa seja identificada e corrigida e que seja instituída uma terapia antimicrobiana adequada.18

O tratamento tópico com agentes antimicrobianos é utilizado para reduzir a carga bacteriana da área afetada e eliminar os debris teciduais.8 Agentes tópicos à base de peróxido de benzoíla podem ser utilizados.11,18

Seborréia

Seborréia é uma doença crônica da pele de cães, caracterizada por um defeito na ceratinização com formação de escamas, devido à hiperproliferação dos ceratinócitos epidérmicos basais, oleosidade excessiva da pele e da pelagem e algumas vezes por inflamação secundária.2,18 É o distúrbio de ceratinização mais comum nos cães.2

Etiologicamente, a seborréia é classificada em primária e secundária. Seborréia primária é um distúrbio hereditário de hiperproliferação epidérmica. É mais comumente vista no Cocker Spaniel Americano, Springer Spaniel Inglês, West Highland White Terrier, Basset Hound, Doberman, Dachshund, Pastor Alemão, Shar Pei e Labrador.2,18

Na maioria dos casos, a seborréia é um fator complicador de uma doença subjacente ou alguma agressão externa que altera a proliferação, diferenciação ou descamação do epitélio superficial e folicular.18,20

São exemplos as desordens metabólicas (hipotireoidismo, hiperadrenocorticismo, hipossomatotropismo, deficiências nutricionais, má absorção/indigestão, doenças pancreáticas), endoparasitismo, doenças ectoparasitárias (queiletielose, demodicose, escabiose), hipersensibilidades (atopia, alergia à picada de ectoparasitos, alergia alimentar), infecções por dermatófitos e algumas desordens auto-imunes.20

A seborréia apresenta sinais clínicos que variam de descamação seca a descamação oleosa, descamação e oleosidade com inflamação e prurido e qualquer combinação dessas anormalidades no mesmo animal.2

Seborréia seca denota o ressecamento da pele e da pelagem. Há descamação focal ou difusa da pele com acúmulo de caspas não aderentes, e a pelagem é áspera e ressecada. Já na seborréia oleosa ocorre o oposto: a pele e os pelos são gordurosos e há presença de mau odor.18 A dermatite seborréica é uma variante mais severa de seborréia oleosa, pois ocasionalmente ocorre inflamação cutânea significativa.2,18

No caso de seborréia seca, a pele e o pelame devem ser umedecidos com shampoos hipoalergênicos umidificantes. Quando a descamação seca for severa, shampoo a base de enxofre e ácidosalicílico podem ser usados. Jpa para controlar a seborréia oleosa, devem ser usados shampoos desengordurantes ceratolíticos, como à base de peróxido de benzoíla, para controlar as escamas e o odor a ela associados. Para pacientes com foliculite bacteriana secundária, antibióticos sistêmicos devem ser utilizados. O uso de prednisona ou prednisolona em uma dose antiinflamatória pode ser necessário durante períodos de inflamação e prurido severo em cães com dermatite seborréica.2

Como na maioria dos distúrbios de ceratinização primários, o objetivo do tratamento na seborréia primária é de controlar a formação de escamas.2 Já no caso da seborréia secundária, é importante a correção da sua causa. A resolução das infecções secundárias e da causa básica da seborréia pode resultar em uma melhora mais rápida.18

Dermatite atópica

A dermatite atópica (ou atopia) é uma doença de pele de caráter genético e inflamatório, na qual o paciente torna-se sensibilizado a antígenos ambientais mediante a formação de anticorpos lg E, causando uma afecção alérgica pruriginosa. É o segundo distúrbio cutâneo alérgico mais comum nos cães e nos gatos, sendo menos frequente apenas que a dermatite alérgica à picada de ectoparasitas (DAPE).2,3,5,18,21

O animal atópico é geneticamente predisposto a ter a barreira epidérmica com defeito, o que provoca maior contato do sistema imunológico cutâneo com antígenos ambientais.3,5,7,12,18 O defeito genético básico da pele atópica é a alteração lipídica na composição da epiderme. As ceramidas, moléculas lipídicas que se encontram nos espaços intercelulares e que têm prorpriedades emolientes, estão em quantidade reduzida na pele atópica, o que altera sua permeabilidade e facilita a perda de água transepidérmica e consequentemente a xerose cutânea.3,5,12

O animal atópico também apresenta uma subexpressão de genes responsáveis pela formação de peptídeos antimicrobianos (as defesnsinas), o que aumenta a predisposição a infecções bacterianas e fúngicas, como por exemplo, infecções por Staphylococcus e/ou Malassezia, exacerbando os sinais clínicos da dermatite atópica.12

Cães com dermatite atópica frequentemente ainda têm uma supercolonização e/ou infecção por Staphylococcus pseudointermedius e/ou M. pachydermatis. As infecções podem contribuir significativamente para o prurido do animal, sendo importante identificar e tratar essas infecções secundárias. Muitas vezes a infecção é generalizada, não sendo suficiente a terapia tópica. Antibióticos sistêmicos e antifúngicos normalmente são necessários.3

Tratamento das infecções cutâneas

A resolução satisfatória de uma infecção de pele necessita que a causa da infecção seja identificada e corrigida e que a infecção receba tratamento adequado, seja de forma tópica, sistêmica, cirúrgica ou por uma combinação destas.18

O tratamento tópico antibacteriano é últil como monoterapia ou com adjuvante da terapia antibacteriana sistêmica. As formas farmacêuticas das medicações típicas são shampoo, gel, spray e creme, sendo os shampoos os mais usados. Estes atuam removendo os detritos dos tecidos, os exsudatos e reduzindo ou eliminando a população bacteriana superficial dentro e ao redor das lesões e estimulando a drenagem. Devido a estas propriedades, podem ser muito úteis na resolução de infecções bacterianas da pele e podem diminuir a frequência de recidivas em casos de piodermite recorrente.18,19

O peróxido de benzoíla, utilizado em shampoos antibacterianos, é ceratolítico e fortemente desengordurante. É um excelente adjuvante do tratamento antibiótico para piodermites bacterianas superficiais e profundas e frequentemente recomendado em distúrbios seborréicos.18,19

No caso de infeções drenantes profundas, o pelo da área deve ser cortado para impedir a formação de uma crosta oclusiva e permitir aos agentes tópicos o contato com os tecidos doentes.18

Para a terapia sistêmica, no caso da piodermite superficial, o uso de antibióticos sistêmicos é indicado por, no mínimo, 21 dias consecutivos ou estender por 7 ou até 14 dias após a cura clínica. Quando se trata de piodermite profunda, o tempo mínimo de antibioticoterapia é de 28 a 42 dias, com a continuação do tratamento durante 14 dias após a cura clínica completa. As drogas normalmente utilizadas incluem agentes de aspectro estreito (como a clidamicina e lincomicina) e as de amplo espectro (como as cefalosporinas de primeira geração). O antibiótico mais comum prescrito empiricamente para cães com piodermite na rotina clínica é a cefalexina.19

A causa mais comumente identificada de incapacidade para resolver uma infecção cutânea ou de sua recidiva dias após o tratamento é a suspensão em curso insuficiente de tratamento. O tempo de aparecimento da recidiva é importante. Se novas lesões aparecem dentro de sete dias do término do tratamento, é provável que a infecção não estivesse resolvida. Nesse caso, um tratamento mais intenso é necessário.

Se ocorrer recidiva, semanas a meses após o último tratamento, o animal provavelmente apresenta algum problema básico que precisa ser resolvido.11,18

Em casos de piodermite crônica e/ou recorrente deve ser solicitado a cultura bacteriana e testes de suscetibilidade para que o tratamento seja de acordo com os resultados obtidos.19

Cefalosporinas

As cefalosporinas são um grupo de antibióticos de grande relevância na área da clínica médica e cirúrgica, sendo especialmente utilizado na clínica de pequenos animais. São antibióticos beta-lactâmicos com amplo espectro de ação e relativamente pouco tóxicos. Os antibióticos beta-lactâmicos constituem uma família de substâncias caracterizadas pela presença de um grupamento químico heterocíclico azetidinona, denominado anel beta-lactâmico. Deste grupo fazem parte as penicilinas, as cefalosporinas, as cefamicinas e oxacefamicinas (axacefemas), as amidinopenicilinas, as carbapenemas, o ácido clavulânico, o sulbactam e os antibióticos monobactâmicos.17

As cefalosporinas têm uma estrutura semelhante a um importante componente da parede bacteriana, o peptidoglicano. A ação destes antibióticos é a inibição da ligação final do peptidoglicano, impedindo a formação da parede bacteriana. Assim, a bactéria não é capaz de manter sua morfologia nem o equilíbrio osmótico com o meio externo. Como agem sobre a formação da parede bacteriana, as cefalosporinas são especialmente ativas em bactérias em fase de multiplicação.4,17

A cefalexina, cefalosporina de primeira geração, é o antimicrobiano de eleição para a terapêutica empírica de muitas enfermidades infecciosas, constituindo o antimicrobiano de primeira linha na maior parte das infecções cutâneas e de tecidos moles.4,17 Caracteriza-se por sua excelente absorção por via oral, ligando-se pouco às proteínas plasmáticas, em torno de 10 a 15%; é eliminada por via renal, tanto por filtração glomerular como por decreção tubular.17

O conhecimento profundo das drogas antimicrobianas e suas indicações é a principal arma na luta contra as infecções que acometem homens e animais, esse conhecimento é fundamental para retardar o surgimento da resistência bacteriana e garantir que os antimicrobianos manterão sua eficácia ao longo do tempo.17

Tratamento alternativo

A busca por opções alternativas de prevenção ou tratamento de doenças como a dermatite atópica ou afecções cutâneas inflamatórias, revela o interesse em estudos dirigidos a ingredientes naturais.8

O uso de ácidos graxos essenciais no tratamento do prurido crônico foi amplamente estudado e seu efeito benéfico comprovado por muitos autores.3,21 Os ácidos graxos como o ácido linoléico (AL), ácido y-linolênico (GLA) ou ácido eicosapentaenóico (EPA) incorporados à membrana celular, competem com o ácido aracdônico (AA) pelas enzimas cicloxigenase e lipoxigenase, diminuindo a produção de leucotrienos e prostagladinas, apresentando, portanto, ação antiinflamatória.3,18,21

Estudos mostram que a dermatite atópica tem associação com o aumento dos níveis de ácido linoléico e diminuição de ácidos como o GLA, DGLA e/ou ácido aracdônico.5,7

O óleo de borragem possuo altas concentrações de ômega-6, que é particularmente importante para a estrutura e função da pele. O ômega06 dos ácidos graxos essenciais é derivado do ácido linoléico, que é convertido em ácido y-linolênico (GLA) e, subsequentemente, outros importantes ácidos graxos essenciais, como o ácido dihomo-y-linolênico (DGLA) e o ácido aracdônico (AA). O óleo de borragem contém aproximadamente 35-40% de ácido linoléico(AL) e 22-24% de ácido t-linolênico (GLA). Sendo assim, tem um significativo potencial terapêutico em casos de dermatite atópica, aumentando os níveis de DGLA nos fosfolipídeos, incluindo lipídeos da pele e levando a um aumento na produção de mediadores antiinflamatórios, como a PGE1.21

A suplementação de ácidos graxos na dieta ou a aplicação tópica de óleos contendo ácidos graxos poderiam diminuir a perda de água pela pele, levando à normalização da barreira epidérmica. O mecanismo sugerido é que essas substâncias se incorporam aos lipídeos intracelulares da epiderme.3,7,21

A Aloe vera, conhecida popularmente como babosa, é uma planta de família Xanthorrhoeaceae encontrada em regiões tropicais, utilizada há muito tempo em diversas partes do mundo para fins medicinais e cosméticos. As principais atividades biológicas atribuídas ao gel são: antimicrobiana, cicatrizante, hidratante, entre outras.6,3

Seu uso em cosméticos justifica-se devido a algumas atividades biológicas evidenciadas, com destaque para as propriedades hidratante, antioxidante, antiinflamatória, cicatrizante e antimicrobiana.13

A atividade antioxidante da Aloe vera está relacionada à presença de betacarotenos, além de outros componentes, como enzimas e compostos fenílicos. A atividade antiinflamatória do gel de Aloe vera está relacionada à indução da síntese de prostaglandinas e infiltração de leucócitos. O efeito antimicrobiano sobre bactérias Gram-positivas e Gram-negativas foi evidenciado por diferentes métodos, bem como sobre o fungo Candida albicans. A ação cicatrizante do gel ocorre pela manutenção da umidade da ferida, estímulo da migração celular e proliferação de fibroblastos, maturação mais rápida do colágeno e redução do processo inflamatório. O gel de Aloe vera possui ainda atividade hidratante.13

Outro componente natural que contém inúmeros benefícios e pode auxiliar humanos e animais que sofrem de afecções cutâneas é a Glycyrrhiza glabra, mais conhecido como alcaçuz. O alcaçuz pertence à família Fabaceae, e é uma erva perena nativa da região do Mediterrâneo.1,8,9,10

O extrato das raízes de alcaçuz possui uma variedade de componentes com açúcares, flavonóides, esteróis, aminoácidos, resinas, amido, óleos essenciais e saponinas. Sua atividade antioxidante se deve à presença de vários isoflavonoides, incluindo a glabridina e seus derivados.6,8,10 Diversas pesquisas destacam atividades antioxidante in vitro e in vivo do esxtrato de sua raíz, seja no sistema gastrointestinal, hepatoprotetor, cerebral ou quando usado de forma tópica.8,9,10 Possui ainda atividade antiinflamatória, bactericida, antialérgica, adstringente, antioxidante, anticarcinogênica, antimicrobiana contra bactérias Gram-positivas em diversas afecções cutâneas.1

Prevenção

A prevenção de infecções cutâneas inclui práticas de higiene e dieta adequadas, um bom controle antiparasitário, tratamento de doenças de base, além de suplementação a animais com deficiência nutricionais.

A utilização concomitante de produtos tópicos contendo componentes com atividades antimicrobianas, antiinflamatória e hidratante pode acelerar o tratamento.

A suplementação com ácidos graxos essenciais (ômega 3 e ômega 6) pode ser eficiente, por exemplo, em casos de seborréia, que pode ser causada pela deficiência dos mesmos. A suplementação desses ácidos graxos na dieta pode resultar em respostas clínicas positivas no controle de inflamações cutâneas.

Conclusão

As afecções dermatológicas têm apresentado, cada vez mais, maior destaque na clínica de pequenos animais, sendo uma das causas mais frequentes de visitas ao consultório veterinário, sendo também objetos de estudos constantes devido, não somente à sua elevada incidência, mas também à relação de proximidade crescente entre os animais e seus proprietários.

Patógenos oportunistas como os estafilococos coagulase-positivos despertam um especial interesse desde que foram publicados estudos evidenciando a transferência dessas bactérias entre humanos e cães.

Uma vez que os animais de companhia, muitas vezes estão em contato estreito com os seus donos, o risco de transmissão de bactérias patogênicas entre animais e seres humanos também deve ser levado em consideração.